“Direito ao esquecimento” – Lembrando da Liberdade de Expressão

Sumário executivo

Nestas diretrizes políticas, a ARTIGO 19 oferece recomendações abrangentes sobre como garantir a proteção ao direito à liberdade de expressão em relação ao chamado “direito ao esquecimento”. O “direito ao esquecimento” geralmente se refere a uma solução que, em algumas circunstâncias, permite aos indivíduos demandarem a buscadores o cancelamento da lista de informações que aparece sobre eles após uma busca por seu nome. Também pode se referir às demandas a sites hospedeiros para apagar certas informações. Mais amplamente, ele tem sido considerado como um direito dos indivíduos “para determinar por si mesmos quando, como e em que medida as informações sobre eles é comunicada aos outros”2 ou como um direito que dá ao indivíduo maior controle das informações sobre eles. Tem sido classificado como um direito de privacidade mesmo que se refira a informação que é, pelo menos em algum grau, pública.

O “direito ao esquecimento” não é expressamente reconhecido em padrões internacionais de direitos humanos nem em constituições nacionais. Seu escopo permanece em grande parte indefinido: varia entre um direito mais limitado, protegido pela existência de uma lei de proteção de dados, até noções mais amplas, abrangendo a proteção da reputação, honra e dignidade. Ele veio à tona com a decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) no caso do Google Espanha de 2014. Neste caso, o TJUE assegurou que os princípios de proteção de dados aplicavam-se à publicação dos resultados de pesquisa dos buscadores e que os indivíduos tinham o direito de solicitar que os buscadores que operam na União Europeia retirem da lista de resultados de busca informações obtidas por uma pesquisa de seu nome. No entanto, esta questão não se limita à Europa, uma vez que depois do julgamento do TJUE, vários Estados fora da Europa adotaram uma lei específica sobre
“direito ao esquecimento” ou estão procurando adotar novas leis sobre o assunto.

A ARTIGO 19 está preocupada com esta evolução e as implicações do “direito ao esquecimento” no que tange o direito à liberdade de expressão. Assim, nestas diretrizes políticas, a ARTIGO 19 propõe uma estrutura como solução para as questões levantadas pelo “direito ao esquecimento”, baseada nas leis internacionais de direitos humanos.

A ARTIGO 19 não defende o reconhecimento do “direito ao esquecimento” em normas nacionais ou internacionais. Ao contrário, nestas diretrizes políticas, se oferecem recomendações detalhadas sobre como conseguir um equilíbrio adequado entre o direito à liberdade de expressão e outros direitos neste contexto, e quais garantias substantivas e processuais deveriam ser colocadas em prática, a fim de proteger o direito à liberdade
de expressão, caso tal “direito” seja reconhecido e concedido.

Recomendações-chave

1. Soluções existentes devem ser aplicadas, como as oferecidas por leis de privacidade e difamação, e também soluções baseadas nos termos e condições dos provedores, ao invés de reconhecer o “direito ao esquecimento”;

2. Qualquer “direito ao esquecimento” deve ser estritamente limitado, com certos requisitos mínimos que devem ser cumpridos para que tal direito seja compatível com o direito à liberdade de expressão, tanto em termos materiais e processuais. Especificamente, o “direito ao esquecimento” deve ser limitado a particulares e deve ser objeto de recurso apenas contra buscadores (como controladores de dados), ao invés de acionável contra serviços de hospedagem ou provedores de conteúdo. Quaisquer proteções devem também fazer referência explícita ao direito à liberdade de expressão como um direito fundamental com o qual a decisão deve ser balanceada. Além disso, as decisões sobre requisições de “direito ao esquecimento” só devem ser emitidas por tribunais ou organismos adjudicatórios independentes;

3. Um rigoroso teste de sete partes para balancear o direito à liberdade de expressão e o “direito ao esquecimento” deve ser aplicado, tendo em consideração:

  • Se a informação em questão é de natureza privada;
  • Se o requerente tinha uma expectativa razoável de privacidade, incluindo a consideração de questões como a conduta anterior, autorização para publicação ou prévia existência da informação em domínio público;
  • Se as informações em causa são de interesse público;
  • Se as informações em causa referem-se a uma figura pública;
  • Se a informação é parte do registro público;• Se o requerente demonstrou danos substanciais;
  • Quão recente é a informação e se mantém o valor de interesse público;

4. Requisitos processuais mínimos devem ser observados, incluindo:

  • Somente tribunais ou órgãos adjudicatórios independentes devem decidir se as requisições de “direito ao esquecimento” devem ser concedidas;
  • Editores de informações devem ser notificados sobre os pedidos de “direito ao esquecimento” e devem ser capazes de recorrer;
  • A remoção de lista deve ter escopo limitado, incluindo geograficamente;
  • Prestadores de serviços relevantes, autoridades públicas e os tribunais devem todos publicar relatórios de transparência sobre o “direito ao esquecimento”.